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O Lobisomem — Virgínia de Castro e Almeida

A crença no lobisomem, muito arreigada entre a gente do campo na Beira Baixa, tem a seguinte forma:

Para um homem ser lobisomem basta que, na ocasião do baptismo, o padre ou um dos padrinhos se engane ao pronunciar as palavras rituais. Só os Manuéis e os Josés estão livres deste perigo, pela virtude bendita dos seus nomes.

Ao princípio, ninguém dá por tal; a criança cresce e medra como outra qualquer. Às vezes já um homem tem cabelos brancos quando chega a sua hora; porém o mal desenvolve-se mais vulgarmente entre os vinte e os trinta anos.

Começa por perder o apetite e fica-se muito tempo a cismar, esquecido, como se a alma lhe andasse separada do corpo. Nada lhe dá gosto, tudo o enfastia, emagrece, encovam-se-lhe os olhos, tremem-lhe as mãos.

Nem curandeiros nem médicos encontram remédio para aquele mal.

Certas noites, levanta-se, vai pelo campo até encontrar pegadas de animal de quatro patas, quase sempre lobo ou jumento. Então despe-se, esconde o fato, espoja-se nas pegadas, e transforma-se no animal que ali passou.

Abala num galope danado, a correr o seu fado, e, antes de raiar o dia, tem de passar por sete cidades acasteladas e voltar ao ponto de partida. Espoja-se no mesmo sítio, retoma a forma humana, veste-se e entra na sua vida habitual.

Título: O Lobisomem
Autor: Virgínia de Castro e Almeida
Data Original de Publicação: 1926
Data de Publicação do eBook: 2022
Imagem da Capa: Fotografia da floresta de Fontainebleau, de Eugène Cuvelier
Revisão: Ricardo Lourenço
ISBN: 978-989-8698-74-2
Texto-Fonte: Contos de Portugal: Trás-os-Montes, Beira Baixa. Lisboa: J. Rodrigues & Cia, 1926.

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